domingo, 29 de abril de 2012

Bloqueou? Páre, escute e olhe!


Bloquear acontece-nos a todos!

Pode acontecer com mais ou menos frequência e os contextos do bloqueio variam de pessoa para pessoa. Há pessoas que têm mais bloqueios de raciocínio ou mesmo de desempenho no trabalho, outras sentem mais bloqueios nas relações familiares, outras em assuntos com “os seus botões”.

Então, se bloquear é comum e, tanto quanto sabemos, ninguém gosta... o que podemos fazer para desbloquear o nosso cérebro nessas alturas e retomar o nosso caminho?

PÁRE, ESCUTE E OLHE... e depois então continue!

É o que se deve fazer antes de atravessar a linha do combóio e ajuda muito a apanhar novamente o nosso combóio.

Vamos trocar a fórmula por miúdos:

PÁRE
Parar de insistir naquilo que não está a funcionar é fundamental para dissipar o bloqueio. É mais ou menos como aquele ditado que diz que não vale a pena “malhar em ferro frio”. Se a coisa não está a funcionar e se sente perto de um nível de frustração elevado, o chamado “ataque de nervos”, o mais sensato é mesmo parar. Ok, tem razão, só parar não chega...

ESCUTE
Escutar é muito mais do que ouvir! É uma das coisas mais úteis que podemos fazer por nós próprios e pela nossa saúde mental em muitas situações. Quando estamos bloqueados podemos e devemos escutar muitas coisas: escutar os outros, escutar-nos a nós, escutar o nosso corpo (coração, estômago, cabeça, músculos... o que me estão a dizer neste momento?), escutar as nossas emoções, intuições, raciocínios. Escutar o silêncio também pode ser importante!

OLHE
E por sua vez, olhar também é mais do que ver. Pode olhar de várias formas e em várias direcções. Pode olhar para o passado à procura de situações semelhantes e de como as resolveu e/ou de estratégias  que não quer repetir; pode olhar para o futuro para ver onde quer chegar. Também pode olhar para si e/ou para o bloqueio de fora, de longe, de outra perspectiva. Pode olhar para os outros, que exemplos o inspiram? Olhe para dentro, para fora, em volta, de cima, vá mudando a perspectiva do seu olhar e descubra como pode ser enriquecedor e útil!

… e depois então continue!
O que descobriu?
O que aprendeu?
O que sentiu?
O que se alterou?
O que permaneceu?

Respire fundo e vai ver que já não vai voltar à situação que parecia bloqueada e impossível de resolver, simplesmente porque ela já se alterou e você já está um passo à frente!

Vera Martins

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Pela sua felicidade, anda a fluir?


O conceito de “fluir” em Psicologia (”flow” em Inglês) refere-se a um estado mental no qual a pessoa se encontra completamente envolvida no que está a fazer.


Ou seja, é o oposto do funcionamento em “piloto automático”, tão desinteressante quanto stressante no nosso dia-a-dia!

Na Psicologia, o conceito foi proposto por Mihaly Csikszentmihaly (Flow: The Psychology of Optimal Experience) que explicava que este estado de “fluir” contribui muito para a felicidade e bem-estar das pessoas.

Quando estamos a “fluir” estamos num estado mental considerado um estado “óptimo” de motivação intrínseca. E é considerado óptimo porque se caracteriza por sentimentos de energia focada e sucesso na actividade na qual estamos completamente imersos e envolvidos.

Csikszentmihaly dizia que, no estado de fluir, “O tempo voa. Cada acção, movimento e pensamento segue-se ao anterior, como numa peça de jazz. Todo o seu ser está envolvido e as suas capacidades estão no máximo”.

Isto é, neste estado de “graça” que é sentirmo-nos a fluir, podemos dizer que a nossa atenção, motivação e capacidades se juntam para produzir um funcionamento produtivo e harmonioso.

Fico a pensar que, na prática, “FLUIR rima com:

- OUVIR
- SENTIR
- CURTIR
- USUFRUIR
- CONSTRUIR
- PROGREDIR
- EVOLUIR

E além de ser uma palavra poética, traz mesmo felicidade!

Permita-se fluir e seja feliz!

Vera Martins
www.veramartins-psicologia.com

segunda-feira, 9 de abril de 2012

Como acordar a criança dentro de nós?


Avisos:

Este texto é só para adultos.
Contém linguagem que pode acordar a criança que existe dentro de si.
Deve ser lido com o coração aberto e a mente disponível.
Perigo de efeitos colaterais: riso fácil, humor positivo, sensação de leveza e descontração, podem ainda surgir doces memórias.
Aconselha-se a sua leitura continuada e repetida.
Não causa dependência mas a habituação é desejável.

Como acordar a criança dentro de nós?

É tão simples e tão complicado ao mesmo tempo...

Tem dado espaço e tempo para a criança dentro de si acordar, saltitar, cantar, rodopiar, rir e conversar?

Não?
Está na hora! E não é difícil...

A sério, é só reparar em pequenas coisas, permitir-se saborear doces momentos...

E, sim, chocolates e rebuçados também valem!

Podem entrar também os brinquedos das crianças que olhamos e namoramos com a paixão de quem adorava brincar e poderia voltar a fazê-lo agora mesmo outra vez e com a mesma inocência e curiosidade com que já o fez um dia.

A música também vale: canções de embalar, as caixas de música, aquela música que a avó ou a mãe cantavam e que na boca delas rimava melhor do que em qualquer outra boca...

E se há música... podemos cantar e dançar... e sonhar!

E também pode entrar a neve a cair, que nos faz tiritar de frio e também de alegria!

E ainda as poças de água que são deliciosas de chapinhar e fazem tudo parecer fácil!

E os puzzles, os jogos de computador e outros que tais!!!

Bem, e, já agora temos que contar com os animais...

Com o cheirinho do arroz doce quentinho...

Ah... e as histórias para crianças??? As histórias infantis que nos derretem o coração...

E entram também as prendinhas, os Aniversários, os Natais, os Carnavais, as Páscoas... as festas que gostamos entram todas (as que não gostamos tanto podem ficar de fora)...

E valem também todos os miminhos e beijinhos e abracinhos!!!

Por fim, não podemos deixar de fora o Sol, a Lua e todas as estrelas!!!!!

E como esquecer a eterna magia do arco-íris?!

E o mar... e o campo... as flores e os frutos...

E a brisa fresca ou o ar quente que parece envolver todo o nosso corpo como uma segunda pele...

E então?? O que pode entrar mais para si neste exercício de fazer acordar e saltitar a criança que existe dentro de si?


Vera Martins

www.veramartins-psicologia.com

terça-feira, 20 de março de 2012

A rejeição dói mesmo!!!


O sentimento de pertença e de inclusão social é um importante factor de bem-estar para todos nós. Mas sabemos bem que nem sempre nos sentimos incluídos ou integrados em alguns contextos relacionais e/sociais.


Quando nos sentimos excluídos de um grupo ou de uma actividade ficamos magoados, feridos nos nossos sentimentos...

Pois bem, a ciência tem mostrado que temos toda a razão: a rejeição dói mesmo!

Ao que parece, alguns dos mecanismos neuronais envolvidos na dor física estarão também envolvidos na dor da rejeição.

Para verificar isto, os investigadores utilizaram a ressonância magnética funcional para estudar a rejeição social. O objectivo era perceber se as regiões cerebrais que são activadas  na rejeição social eram similares às que são encontradas em estudos da dor física.

Neste estudo foram estudadas as respostas neuronais em dois tipos de exclusão social: explícita e implícita. Além da ressonância funcional durante as tarefas propostas, os participantes preenchiam questionários após as tarefas para avaliar o quanto se tinham sentido excluídos.

Resumindo os resultados, na exclusão social é encontrado um padrão de activação cerebral muito similar ao que é encontrado na dor física.

Os autores deste estudo deixam-nos a mensagem de que o facto de a dor da rejeição ser parecida com a dor física a nível cerebral tem também a função de alertar-nos para as feridas nas nossas ligações e relações sociais. Com este alerta, poderemos tomar medidas para tratar destas feridas.

Sugerem ainda que este tipo de estudos podem ajudar a confirmar a importância das relações e do apoio daqueles que nos rodeiam quer na dor física, quer na dor social e também a perceber como dói tanto perder alguém que amamos...

É mesmo caso para dizer que depois de uma rejeição ou de uma perda afectiva temos a necessidade e o direito de “lamber as nossas feridas”!

Vera Martins

Referência:

Does Rejection Hurt? An fMRI Study of Social Exclusion
Naomi I. Eisenberger, Matthew D. Lieberman, Kipling D. Williams
10 OCTOBER 2003 VOL 302 SCIENCE

Artigo completo para consulta em:
http://www.rickhanson.net/wp-content/files/papers/RejectionHurt.pdf

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

10 Recomendações para as PMD - Pessoas em Mudança e Desenvolvimento

Há algumas semanas, li um artigo interessante de Francisco de Almeida no Jornal de Negócios cujo título é 10 Recomendações para as PME para 2012.

Quando o li, o meu 1º pensamento foi que, de certa forma, a vida de cada um de nós é uma empresa. Ora, nesta lógica, também podemos beneficiar destas recomendações para gerir e promover a nossa empresa pessoal.

Assim, espero que o autor do texto original fique orgulhoso por ver as suas ideias aproveitadas com o objectivo de nos ajudar a progredir na carreira de gestores da nossa vida.

Assim, partilho convosco as 10 recomendações de Francisco de Almeida para as PME, adaptadas por mim para as PMD - As Pessoas em Mudança e Desenvolvimento:

1 - Aprofundar a relação com os outros - Promovendo a proximidade, conhecendo melhor o outro e dando-se também a conhecer.

2 - Actualizar-se - É importante estarmos a par do que acontece no contexto onde estamos inseridos: saiba todas as novidades (não são as fofocas) da sua família, dos seus amigos, do seu bairro, da sua cidade, do seu País, etc. Quando as novidades forem boas, não se esqueça de comemorar!

3 - Capitalizar no crescimento das relações sociais - A nossa rede social é essencial como pilar de apoio, de afecto, de crescimento e bem-estar.

4 - Apostar na internacionalização - Há muitas formas de o fazer. Se não pudermos viajar, podemos correr mundo através da internet ou, por exemplo, aprender uma língua estrangeira. Além de ser excelente para o nosso cérebro, já é possível encontrar cursos online que são gratuitos e, portanto, acessíveis a todos.

5 - Colaborar com outras pessoas - Podemos e devemos contribuir para que outras pessoas pequenas ou grandes realizem as suas tarefas fáceis ou difíceis, os seus sonhos possíveis ou impossíveis. Dar é, também, receber.

6 - Apostar na formação - O saber não ocupa lugar e é muito útil no nosso crescimento profissional e pessoal. Lembra-se daquelas aulas de pintura ou de canto que quer fazer há muito tempo? E o curso de escrita criativa há muito adiado? E o...? E a formação em...?

7 - Procurar um mentor - Quem são as pessoas que o inspiram na sua vida? Fale com elas, pergunte-lhes como fazem aquilo que mais admira. Mostre-se disponível para aprender com elas. Na impossibilidade de lhes falar, siga os seus exemplos.

8 - Poupar capital privado - É verdade que o dinheiro se fez para gastar mas fazer algumas poupanças é sempre uma boa ideia.

9 - Planear o futuro - Sonhe, visualize aquilo que quer para si. Só podemos dirigir-nos para um objectivo quando ele está claro e visível para nós.

10 - Saber desistir - Não gostamos muito e habitualmente associamos desistência a fraqueza ou a falhanço pessoal. Mas não é sempre assim, é preciso sabedoria para escolher desistir ou desinvestir de algo que nos está a prejudicar, sejam relações, ambientes, decisões, etc.

O segredo das pessoas mais felizes é serem PMD - Pessoas em Mudança e Desenvolvimento!

Vera Martins

Com os devidos agradecimentos a Francisco de Almeida. Encontram o seu texto com 10 Recomendações para as PME para 2012 aqui

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Isso é comigo??!!

É provável que não seja...

Há dias em que sentimos que o “mundo está contra nós” e que tudo o que as pessoas dizem ou fazem é dirigido a nós.

Quando estes dias se repetem muito causam-nos sofrimento e deixam a nossa auto-estima em baixo além de afectarem a nossa capacidade de discernimento.

Mas não podemos personalizar tudo, muitas vezes levamos coisas “a peito” que, na verdade, não tinham mesmo nada a ver connosco nem eram dirigidas a nós. Pode haver simplesmente dias maus e isso não quer dizer que nós é que somos maus.

Tal como o bom humor, o mau humor parece ser contagiante!

Já todos nós experimentámos dias assim, daqueles em que parece que uma nuvem negra nos envolve... Quem está na posse da nuvem negra tenta soprá-la para outra banda.

Ora, quando personalizamos qualquer coisa de negativo que outra pessoa diz e a recebemos como sendo para nós estamos a abrir a janela para receber a nuvem negra.

Mas, na maioria das vezes o que se passa não é mesmo connosco, o que é dito com cor mais escura não é mesmo para nós!

Por isso, não personalize tudo. Às vezes gostaríamos que tudo girasse à nossa volta mas não é sempre assim. E, no caso das nuvens negras é bom que não seja!

Viva mais descontraído, não leve tudo “a peito” e sopre as nuvens negras para longe de si e, já agora, para longe dos outros...

Xô, mau humor!!!

Vera Martins
veramartins.psicologia@gmail.com

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Será rigidez ou nem por isso?

Há um aspecto que costuma, entre outros, ser um bom indicador de boa forma física: a flexibilidade. Se me mexo bem, com facilidade, consigo tolerar posições mais difíceis ou pouco usuais sem me lesionar, então o meu corpo é flexível. Caso contrário o meu corpo apresenta maior rigidez ou menor flexibilidade.

Mas então o que dizer da nossa boa forma psicológica?

Não será também importante cultivar e manter a nossa flexibilidade cognitiva e emocional?

De facto, uma boa parte do nosso bem-estar psíquico depende também da nossa flexibilidade a nível de pensamentos e raciocínios o que, consequentemente, terá efeitos sobre o nosso funcionamento emocional. Todos estes elementos em conjunto irão traduzir-se em atitudes e comportamentos mais rígidos ou mais flexíveis.

Como podemos então ser mais flexíveis?

- Dispensando o uso das palavras “sempre” e “nunca” - Lá diz o ditado que “Nem sempre nem nunca”!

- Evitando os raciocínios baseados na lei do “tudo ou nada”  ou do “preto e branco” - na maioria das situações há pontos intermédios entre o zero e o cem e outras cores entre o preto e o branco.

- Mudando o nosso discurso do “devo” e “tenho que” - o nível de exigência que pomos nestas palavras já é só por si carregado do sentido da provável falha. Porque não dizer antes “posso” ou “preciso de”?

- Reconhecendo que raras vezes podemos saber ou prever como determinada situação vai terminar - é importante mantermos a curiosidade e o optimismo sobre os resultados a esperar.

- Aceitando que mudar de ideias é absolutamente normal e saudável - uma vez que viver é uma aprendizagem constante é perfeitamente normal e legítimo ter uma ideia hoje e outra amanhã e até outra depois de amanhã sobre o mesmo assunto.

- Lembrando que os planos são apenas planos - é natural que precisem de sofrer ajustes e alterações.

- Assumindo que praticamente tudo tem vantagens e desvantagens - às vezes temos tendência a adoptar filtros para ver só os aspectos negativos ou só os aspectos positivos de uma situação. E quando se trata de desvantagens somos mesmo peritos em enumerá-las... se é para avaliar, é bom não esquecer as vantagens!

Se experimentar algumas destas alterações no seu dia-a-dia vai sentir que tudo flui melhor, poderá surpreender-se com o aumento de emoções positivas e com a melhoria da sua capacidade de adaptação às situações.

Se for aos treinos vai ver que, à semelhança da flexibilidade física, vai conseguir lidar melhor com posições difíceis sem se lesionar!

Vera Martins
www.veramartins-psicologia.com


quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

O nosso precioso Google interno

O motor de busca da Google deve ser hoje em dia o mais usado ou dos mais usados para fazer pesquisas na internet. Inclusivamente por questões práticas já é comum usar-se em Português a expressão “googlar” um tema ou uma palavra como sinónimo de “procurar na internet”.

Há dias numa consulta dei comigo a dizer a uma paciente que se sentia sem possibilidade de recorrer a ajuda externa para um determinado assunto: “Então, se for googlar dentro de si o que é que encontra?”

E a verdade é que temos alguma tendência a procurar muitas das respostas fora de nós esquecendo-nos que temos dentro de nós um manancial de informação que a vida já nos ofereceu e que nos é extremamente útil.

A experiência de vida é uma das maiores riquezas que podemos ter. À medida que vamos andando na estrada da vida vamos colecionando emoções, informações sensoriais, experiências, relações, etc que nos ensinam muitas coisas.

Ou seja, viver simplesmente vai permitindo que nos tornemos dotados de muitos recursos e ferramentas para lidarmos com as mais variadas situações de vida, sejam elas novas ou semelhantes a situações anteriores.

No entanto, parecemos muitas vezes esquecidos da nossa sabedoria e procuramos nos outros ou até nos livros respostas que podem estar mesmo ali á mão.

É claro que também é importante contar com a ajuda das pessoas que nos rodeiam e são significativas para nós, é bom pedir opiniões e muitas vezes estas ajudas externas são ajudas de qualidade.

A minha proposta não é que nos fechemos em nós próprios e deixemos de recorrer às nossas relações e à experiência de vida dos outros, que é também bastante valiosa. A ideia que tentei passar à minha paciente foi que, perante a ausência de respostas fora de si, pode sempre contar com a sua riqueza interna para encontrar saída para os seus conflitos e respostas adequadas para as suas perguntas.

É bom lembrar que a sabedoria interna de cada um pode ajudar (e muito!) nos momentos em que não nos pareça possível ou razoável encontrar boas respostas fora de nós.

Claro que devemos ter para com as nossas próprias respostas os mesmos cuidados que devemos ter com as respostas dos outros ou da internet: avaliar o bom senso, a congruência, a consistência, a utilidade e a eficácia da informação que encontramos dentro de nós.

Ou seja, tirando alguns cuidados que aplicamos à maioria das informações em geral, podemos confiar que também sabemos encontrar em nós boas respostas ou opiniões fiáveis e úteis para questões que nos preocupam.

Por isso, não se esqueça de googlar dentro de si sempre que necessário!

Vera Martins


quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Como é que a crise nos vai mudar?


“Quando escrito em chinês a palavra crise compõe-se de dois caracteres: um representa perigo e o outro representa oportunidade.”
John Kennedy (in Citador)

Tinha encontrado esta citação há uns meses e agora senti que ela vinha mesmo a calhar!

A palavra crise passou a fazer parte do nosso dia-a-dia. Passou de boato a realidade e com uma dose maior ou menor de susto vamos fazendo o nosso papel de navegadores: há que remar, manter o sentido de orientação, posicionar o leme para definir a direcção, superar os enjoos e alimentar a esperança de ver terra no horizonte!

E a verdade é que nós somos bons nesse papel, não tivéssemos nós uma tradição de descobertas além-mar de fazer inveja ao mundo inteiro! Mesmo que não saibamos e nos possamos ir esquecendo somos verdadeiramente bons a navegar em águas turbulentas.

Esta semana li um artigo no Jornal Público que, apesar de tudo, me fez sorrir e perceber que não estou enganada: nós somos mesmo um povo intrinsecamente bom, cheio de qualidades e há quem anteveja reviravoltas simpáticas nos nossos ensaios para lidar com a crise económica.

O artigo de que falo é da jornalista Maria João Lopes e foi publicado na edição de 22 de Janeiro do referido jornal e o seu título é “Em 2012 vamos conhecer o vizinho, cuidar da horta e integrar uma associação”.

Para elaborar este artigo a jornalista falou com alguns investigadores, escritores, sociólogos e historiadores para perceber as alterações que poderão registar-se no nosso comportamento em resposta à crise económica que atravessamos.

E o resultado é, no mínimo, curioso!

Não vou reproduzir todo o artigo, mas gostava de destacar algumas das ideias e, permitam-me ser tendenciosa,  vou referir as que mais gostei:

- «O escritor Mário Zambujal acredita que as pessoas vão "visitar-se mais": "Vão juntar-se nas casas umas das outras para uma festinha."»

- «Maria Filomena Mendes realça também o recurso à bicicleta ou a andar a pé, até porque muita gente abandonará os ginásios.»

- «O presidente da Cáritas Diocesana do Porto, Barros Marques, acredita que estes comportamentos fomentarão "um estilo de vida mais comunitário e menos individualista: "Vamos criar laços de alguma economia doméstica, familiar, fazer reuniões com amigos", partilhando comida. "E regressarão as grandes tertúlias e o associativismo, como espaços de debate, de troca de impressões, de esclarecimento, nos quais as pessoas sintam que estão a remar juntas." »

- «"Não vamos poder ficar presos às funções que sempre tivemos, vamos ter de pegar em projectos diferentes." As alterações também se notarão na iniciativa das pessoas: "Vão criar alternativas, o seu próprio emprego e fazerem aquilo que sabem e gostammesmo ganhando menos e trabalhando mais." » - Palavras de Dalila Pinto Almeida, autora do livro Mudar de Vida.

- «Outro aspecto que antevê é "o surgimento de uma economia informal: sobretudo os desempregados aproveitarão as habilidades para, por exemplo, fazer carteiras em tecido para vender através do Facebook, na sua casa ou na de amigos". Aparecerão "negócios pequenos, de nicho": "Vai fomentar-se a criatividade", defende» - A mesma autora.

- «O humorista Nilton prevê um bom ano para os seus espectáculos: "As pessoas vão querer rir-se mais. O humor é uma arma contra a crise"»

- «Mas há quem anteveja outras soluções como o voluntariado: "Podemos ver professores reformados a dispor do tempo para cuidar de crianças num bairro, porque os pais deixaram de ter dinheiro para o ATL", defende Maria Filomena Mendes. Também o sociólogo Elísio Estanque considera que o "humanismo e a solidariedade podem ser mais visíveis". »

- «(...) vamos chegar a um ponto de nos voltarmos para coisas que não estão à venda nos shoppings , como ver nascer o sol na Arrábida", brinca.» - Palavras ainda de Elísio Estanque.

- «Elísio Estanque acredita que as hortas vão regressar, mesmo nas cidades: "As pessoas com quintal, com pequenos talhões de terra, poderão usufruir dessa actividade não só para responder a necessidades materiais, mas também como forma lúdica de ocupação do tempo."»

Então, se for verdade que vamos ser mais humanos, afectuosos, criativos, altruistas,  ecológicos e ainda vamos manter o bom humor... somos ou não somos muito bons???

A crise económica é bem diferente da crise de valores e estes, ao que parece, vamos conseguindo mantê-los de pé!

Vera Martins

Referências:http://www.publico.pt/Sociedade/em-2012-vamos-conhecer-o-vizinho-cuidar-da-horta-e-integrar-uma-associacao-1530217?p=1

http://pensador.uol.com.br/significado_da_palavra_crise/

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Acha mesmo que a curiosidade matou o gato?

Quem já leu textos meus já vai sabendo que gosto de provérbios mas, como em tudo, abro uma excepção para alguns provérbios e este é um deles: “A curiosidade matou o gato” ou, na versão mais moderna, "Curiosidade mata". É que tenho logo vontade de responder: A curiosidade não mata ninguém!

Curiosa que sou (e, pasme-se, continuo viva!), fui à procura da origem deste ditado e descobri que na Europa, durante a Idade Média as pessoas acreditavam que os gatos pretos traziam má sorte e, por isso, montavam armadilhas. Os pobres gatos, andavam nas suas explorações e sucumbiam às armadilhas. Portanto, fica claro que os gatos eram mortos por armadilhas...

A curiosidade é das características mais extraordinárias que um ser humano de qualquer idade pode ter. E digo de qualquer idade porque, com frequência, a curiosidade é associada às crianças. E é verdade que as crianças são fantásticas por muitas coisas, sendo a curiosidade uma das suas características mais valiosas, um verdadeiro investimento para o futuro. Mas a curiosidade é importante em todas as idades.

Alimentar a nossa curiosidade constitui-se para nós como uma espécie de seguro de vida mas, muitas vezes, ainda não olhamos para a curiosidade com um olhar positivo. Tantas vezes criticamos e até proibimos a curiosidade, sobretudo nos mais novos. Talvez porque às vezes se confunde curiosidade com “fofoca” ou “cusquice”.

Mas há que distinguir o que é curiosidade das outras formas de questionamento ou intrusão da vida alheia. No entanto, também pode ser saudável e enriquecedor termos curiosidade sobre a vida alheia... não podemos generalizar e partir sempre do princípio que a curiosidade é prejudicial ou que tem consequências negativas.

Como podemos distinguir? Em geral a curiosidade não prejudica ninguém, não contém juízos de valor e gera conhecimento.

Encontrei um artigo de Bruce D. Perry, da revista Early Childhood Today, que apresenta um esquema resumido sobre a curiosidade. Traduzi o seu esquema para partilhar aqui por ter sentido que ilustra de forma simples como a curiosidade, além de conhecimento, pode gerar valor, crescimento, emoções positivas e fazer de nós pessoas melhores. Lembra-se da ideia do seguro de vida? Veja lá se a curiosidade não é uma espécie de seguro de vida emocional...

O médico Bruce D. Perry diz-nos que a curiosidade é o “combustível para o desenvolvimento” e explica porquê:

Curiosidade resulta em Exploração
Exploração resulta em Descoberta
Descoberta resulta em Prazer
Prazer resulta em Repetição
Repetição resulta em Mestria
Mestria resulta em Novas Competências
Novas Competências resultam em Confiança
Confiança resulta em Auto-Estima
Auto-Estima resulta em Sentimento de Segurança
Sentimento de Segurança resulta em Mais Exploração

Sendo assim, para promover o desenvolvimento emocional e cognitivo e para bem de todos é mesmo importante sermos curiosos!

Gostava de dizer:

A quem não é curioso, que ainda está a tempo de ser.

A quem já é curioso, que pode ser ainda mais curioso.

A todos nós, que educamos crianças, que...
… se alguma coisa matou o gato, não foi a curiosidade!


Vera Martins
www.veramartins-psicologia.com

Referências:
http://www.scholastic.com/teachers/article/emotional-development-curiosity-fuel-development

http://pt.wikipedia.org/wiki/A_curiosidade_matou_o_gato

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

É errado estar errado?


O medo de errar é um medo muito comum. Muitas pessoas têm esta preocupação com a possibilidade de errar, que pode ser sentida com maior ou menor intensidade, mas o que é facto é que, em geral, o medo de errar vai estando presente ao longo da nossa vida.


Em psicoterapia é um dos medos que os pacientes de várias idades mais expressam: medo de fazer algo de errado, medo de dizer algo de errado, medo de fazer a escolha errada. medo de cometer erros nas relações, no trabalho, na educação dos filhos, etc.

Quanto mais me cruzo com este medo tão frequente, na prática clínica mas também nos variados contextos relacionais do dia-a-dia, mais sinto que é preciso desmistificar esta questão.

O que transforma esta questão num problema é o facto de alguém sofrer com isto, tanto mais que se trata de um sofrimento por antecipação. Com a agravante de que, quando o sofrimento é elevado, prejudica o raciocínio e a própria capacidade para agir e ficamos com um cenário complicado:

- Quanto maior o medo de errar, maior a probabilidade de vir a errar mesmo.

Se fosse possível colocar o medo de errar numa ilustração matemática teríamos:

Ansiedade antecipatória + dificuldade de raciocínio + dificuldade de desempenho = maior probabilidade de erro

E se o erro acontecer mesmo, só vamos confirmar que o nosso medo tinha razão de ser e aprendemos para o futuro que é normal ter medo de errar “porque eu já errei no passado e é provável que venha a errar no futuro”... a conhecida “bola de neve” ou, para os gostos mais culinários, a “pescadinha de rabo na boca”:

Mais erro - mais medo
Mais medo - mais erro
Mais erro - ….

Mas então como derreter a bola de neve ou arrancar o rabo da boca (da pescadinha, pois claro) para interromper este ciclo?

1 º Por razões de ordem prática propunha separarmos o medo do “errar” em si -  Eles não têm que andar juntos. Nas primeiras vezes que fazemos alguma coisa não temos medo de a fazer. Antes da 1ª queda não tínhamos medo de andar. O medo é aprendido e é difícil lutar contra ele mas vamos fazer como nas receitas de bolos só que em vez de separar a clara da gema... “separe o medo da acção e reserve” (uma vez que não podemos anular o que sentimos, tentemos manter a ideia nítida de que são 2 coisas separadas e distintas).

2º As avaliações só se podem fazer no final de um processo - o medo resulta da avaliação da experiência anterior e não desta. Mas é fácil confundir a avaliação da anterior com a avaliação da experiência actual.
É bom lembrar que não podemos começar a casa pelo telhado. Portanto, não podemos avaliar a nossa acção antes de tentar.
Embora pensemos no telhado, deixamo-lo para o fim. Da mesma forma, devemos deixar as avaliações também para o fim e não nos criticarmos ainda antes de fazer algo. Não podemos saber por antecipação que vamos errar...

3º “Quem nunca errou, nunca fez nada” - Os ditados populares, além da sabedoria que encerram ainda têm o mérito de serem auto-explicativos!

4º A errar também se aprende - A Psicologia da Aprendizagem reconhece mesmo a chamada “aprendizagem por tentativa e erro” como um processo de aprendizagem válido e, em alguns contextos, é mesmo o mais adequado para agir e aprender. Eu atrevo-me a dizer que no contexto de vida “normal” é mesmo o que melhor nos serve na maioria das circunstâncias, uma vez que  não dominamos totalmente a vida e todas as suas variáveis...

5º Por fim, só é possível errar depois de tentar, fazer, dizer, escolher, etc - Se tentámos, fizemos, dissemos, escolhemos e ainda não acertámos... na maioria dos casos, isso apenas quer dizer que precisamos de tentar, fazer, dizer, escolher outra vez!

E afinal pergunto: Mas então é errado estar errado?

Vera Martins
www.veramartins-psicologia.com