domingo, 4 de dezembro de 2011

O que poderia ser aquela nuvem?

Há dias estive a contemplar as nuvens. Num daqueles dias em que não choveu mas elas lá andavam pelo céu: fofas, altas e branquinhas.

E lembrei-me de quando era miúda e ficava a adivinhar princesas, castelos, bailarinas, pássaros e árvores nas nuvens que pairavam acima do meu mundo de criança. Um mundo ainda sem grandes preocupações, sem crises, nem política, nem doenças graves, nem outros males e aflições que povoam a vida dos adultos.

E estão os leitores a pensar, e muito bem, que eu não era lá muito original porque, afinal de contas, brincar com as nuvens é entretém habitual de todas as crianças. E, de facto, eu não era muito original, era como as outras crianças que são dotadas de enorme criatividade para brincar, não só com as nuvens mas também com as suas percepções dos objectos e do mundo em geral.

Quando somos crianças uma garrafa pode ser um carro, uma pessoa, um comboio, um avião, servir de apito, de bola, de rolo da massa... E assim vamos vivendo e aprendendo a usar a imaginação e a percepção a nosso favor.

Mas depois há uma fase em que isto começa a mudar... Começamos a perder este à vontade de fazer com as nossas coisas e a nossa vida o que queremos, começamos a usar menos a imaginação a nosso favor e uma nuvem passa a ser só uma nuvem, uma garrafa de água passar a ser só uma garrafa de água...

Nesta nossa nova vida de seres adultos, sérios e preocupados passamos a viver muito mais no concreto, as nossas percepções tendem a ficar mais rígidas e damos muito menos espaço à imaginação.

Bem, e é assim que a crise passa a ser apenas a crise, os problemas de trabalho são apenas problemas, o desemprego é só o desemprego, etc, etc...

Para onde terá ido a nossa capacidade de aprender com o que não temos, reinventar o que temos e criar o que nos faz falta?

Quando temos problemas para resolver costumamos dizer que andamos com nuvens negras a pairar por cima da cabeça. Será que não podemos resgatar as qualidades magníficas da infância e reinterpretar estas nuvens negras?

Os problemas serão só problemas? Podem ser uma oportunidade para algo de novo e diferente? O que posso aprender? Se preciso de algo, o que posso criar para passar a ter o que me falta ou qualquer coisa que se aproxime?

Se eu olhar para a minha nuvem com a mente aberta de uma criança e permitir-me deixar que a minha percepção seja plástica e moldável em vez de ser rígida e fechada, o que poderei obter?

A nossa infância é o melhor estágio que fazemos para desempenharmos melhor o nosso papel de adultos. Mas temos tendência a esquecer-nos de como éramos tão capazes e audazes, do muito que fizemos e da pessoa tão competente que já éramos nessa altura. É certo que mudamos, crescemos, acumulamos muitas experiências que moldam a nossa personalidade, mas há competências que não se perdem... é como andar de bicicleta! Treinámos na infância, muitos de nós deixaram de o fazer, mas se tentarmos agora conseguimos!

Estou convicta de que seremos adultos mais felizes e saudáveis se relembrarmos as competências básicas deste treino de vida chamado infância. Podemos voltar a usar a nosso favor todas as competências que tão bem usámos e treinámos no passado: a imaginação, a criatividade, o sorriso, a flexibilidade para percepcionar o mundo e os outros, a disponibilidade para aprender e a liberdade para crescer.

Sim, sim, é que os adultos também crescem!

Vera Martins

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